Monday, October 9, 2017

Falsa liberdade

          Queria poder te ver e te dizer que não posso mais viver assim. Queria poder ouvir na tua voz todas as palavras que me libertam dessa prisão. O cerco foi tão bem construído que mesmo depois de abrir o cadeado, eu não consegui sair. Não parecia certo pisar fora enquanto tudo que era meu ficaria ali. Os pedacinhos que me foram arrancados enquanto estive presa não viriam comigo. Eu preciso que você me diga que eu posso carregá-los em meus braços quando disser adeus. Decerto ainda não sei como colocá-los de volta, mas pelo menos vou ter muito tempo para descobrir. Sem eles, de nada me adianta esse tempo.
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          Não é Síndrome de Estocolmo. Garanto-lhe que você não fará falta. Não escolhi ficar por pensar que preciso de você comigo. Não escolhi ficar. Eu não sei ir pela metade. É como se uma perna estivesse imóvel, e a outra nem estivesse aqui. Se fosse escolha, eu já estava bem longe de ti. Porém, você ainda tem que me devolver a minha essência. Ninguém mais tem o que você roubou. Teu prêmio nada te serve. Ele só tem sentido em mim. Talvez seja isso. Você não quer me ver sentir. Você quer me dar a falsa ideia de liberdade, enquanto continua sua maior tortura. Sabe bem que as grades nunca me incomodaram. Você soube bem como passar minha determinação em um ralador, e despedaçar até os últimos resquícios.
          Decidi arriscar. Vou para não mais voltar. Sem olhar para trás, vou memorizar cada lasquinha que me falta. Vou resistir às dificuldades, como resisti aqui. Vou crescer, me remontar, me refazer. Depois que me sentir completa, vou me encher ainda mais. Nunca mais quero ser vítima de tormentos como esse, muito menos me sentir culpada pelas consequências. Vou aprender que o que passou também me construiu. Não fiquei negativada. Pelo contrário, cada parcela que me foi roubada ajudou a criar uma nova. Cada vacilo que cometi, me gerou reflexão. Meu conjunto de reflexões vai me ajudar a ganhar de volta toda confiança que arrancou. Não tenho mais medo. Você ganhou muitas batalhas, você fraquejou minhas barreiras, até destruiu algumas, mas não matou o principal: minha vontade.