Sunday, September 2, 2012

Sem título (1)

      Alguns copos vazios esperando mais cerveja. Uma roda de amigos e conhecidos. Alguns violões, várias vozes, poucas belas o suficiente para tornar a música espetacular. O que importava era o momento: risadas, danças, amores. Naquela noite, nada era cinza, ainda que estivesse escuro. Bastava a fogueira vermelha e amarela iluminando o sorriso de cada um que estava ali para comprovar a alegria que se instalara.
      "Fuga" era o nome que havia sido estabelecido para aquele lual. O número de copos não ultrapassava a faixa dos 30. Ela foi ainda que não conhecesse muitas daquelas mãos que seguravam os copos. Não era a garota mais sociável dali, mas gostava de estar envolta de pessoas a fim de curtirem a mesma sensação, queriam apenas fugir de todos os problemas que enfrentavam semana a semana, fosse em casa, na faculdade, nos relacionamentos. O importante era sorrir sem medo da inveja.
      Estava hospedada na casa da dona de um dos quatro violões que eram tocados naquela roda. Já havia desenvolvido uma certa intimidade com duas ou três pessoas dali. O resto poderia ter visto antes, até saber o nome, porém não sentia-se confortável o suficiente para conversar.
      Bebia, ainda que pouco. Tinha o interesse de ficar alegre no álcool, mas não tinha pressa:
      - Mais?
      - Calma! Ainda nem terminei esse - um quarto de sorriso, um quarto de cerveja no copo.
      As melodias variavam de animadas a calmas sem muita reclamação. Todos cantavam como se fossem as músicas mais contagiantes eleitas pelo top 10 da MTV. Conhecendo boa parte delas, sua voz tímida acompanhava de leve cada canção. Tinha consciência de que não era a melhor cantora do mundo, por isso procurava poupar os que poderiam ouvir seu canto. Sua amiga conseguia ir do grave ao agudo em segundos, isenta de desafinações.
      Qualquer um poderia sugerir uma música. Funcionava como um karaokê. Quer uma música? Tem que cantá-la. É claro que era provável que todos acompanhassem, no entanto sempre deveria haver alguém que puxasse o coro. Não sabe tocar violão? Pede para alguém tocar para você. Era uma forma simples e humilde de todos participarem de um bom momento. Claramente que alguns cantavam mais que outros, mas a maioria tinha seu solo preservado.
      Passaram-se algumas horas. Além de músicas, brincadeiras, piadas, histórias. Todos já estavam sob efeito da cevada com uma pequena porcentagem de álcool. Muitos dançavam; alguns se despiam, - não por completo - mas logo vestiam-se de novo, pois o frio não permitia muita exposição.
      Um rosto não muito familiar sugeriu uma música.
      - Você quer o violão?
      - Manda aí. - as mãos desocupadas de copos passavam o violão para o garoto.
      Virou o que restava da cerveja, depositou a caneca ao lado. Limpou a garganta, preparou o violão, respirou fundo. Bastou a primeira rima da canção para deixá-la estupefata. Aquela voz agradava seus ouvidos de modo que, mesmo sendo uma das suas músicas preferidas, não conseguia acompanhar. Ou melhor, optou em não acompanhar para não atrapalhar. Não foi a única. Alguns cantavam junto, porém baixinho, apenas para sentirem-se no clima tanto quanto o cantor.
      De olhos fechados ele sentia o som e transmitia a sensação. A roda dançava apenas com a cabeça na harmonia que os dedos dele passavam pelas cordas. Ao fim, aplausos. Já ela, não contendo-se, urrou de leve. Todos gargalharam e urraram em apoio. O garoto pouco envergonhado, levantou-se e fez aquele velho agradecimento de ator depois que as cortinas se fecham e os personagens são guardados.
      Mais garrafas foram requisitadas e ela resolveu acompanhar sua amiga e seu amigo ao carro. Não estava muito longe, mas o isopor onde as cervejas estavam era pesado. Três pessoas eram o bastante para trocar o gelo e renovar as garrafas.
      Giovani perguntou pelas chaves:
      - Estão comigo. - ela garantiu.
      - Ela é mais responsável do que eu. Sabe como fico quando bebo, não é? - Laila falou já com a voz arrastada e a risada na ponta da língua.
      - Sim, Lai. Eu sei - a risada dele não negava a alteração que estava surgindo. Então ele envolveu os braços na dona do carro e beijou sua bochecha, enquanto Olive caçoava daqueles bêbados.
      Abriram o porta-mala que ainda continha garrafa o suficiente para o amanhecer. Adicionaram mais gelo, mais garrafa, mais garrafas.
      - Vamos fazer um brinde?
      - Brinde? Para - o soluço de Laila interrompeu sua fala - o que, Gio?
      - Para esta noite, ué. Vocês, eu, nosso lindo menage - risadas intermináveis do trio.
      - Até parece, não é? - disse Laila e Olive concordou.
      - Ei.. - uma voz externa entoou.
      Os três olharam curiosos. Era o garoto da voz contagiante.
      - E aí, cara? Mandou bem naquela música, viu?
      - Valeu, cara. - sorriu sem jeito para o bêbado Giovani - Rola um copo antes de vocês levarem para lá? Porque mal bebi. Essa gente parece que nunca mais vai beber na vida.
      - Claro! Toma aqui. - despejou na caneca dele, aproveitando para encher o copo das meninas e o próprio - Ah! Esse é o Hugo. Hugo, essa é a Olive e a Laila. Não sei se lembra da Laila.
      - A gente se conheceu no boliche há duas semanas, não foi? - ela confirmou - lembro sim.
      - Enfim! Estávamos fazendo um brinde, quer se juntar?
      - Com certeza, cara!
      - À noite inesquecível que estamos tendo!
      Todos brindaram e viraram seus copos até não sobrar nem uma gota para contar história.
      Isopor cheio, mãos à obra. Não havia necessidade, mas os quatro contribuíram no transporte do isopor pelos quarenta metros que os distanciavam da fogueira.
      Chegando lá, a música parou e todos comemoraram por ter mais cerveja para se embriagarem. Laila pegou uma garrafa e Giovani a acompanhou até a toalha que estavam sentados. Hugo olhou para Olive procurando lembrar daquele rosto, não teve muito sucesso:
      - A gente já se conhecia?
   
   

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