Wednesday, October 12, 2011

Bons amigos

   - Ele disse que somos bons amigos... - cabisbaixa.
   - Então... - exaltada - isso é desculpa?
   - Não, é um motivo. - esforçando-se para segurar o choro.
   - Isso é desculpa! - deixando a revolta tomar conta - Ele espera namorar quem? Uma inimiga? Um garota com a qual ele não consegue trocar uma palavra? Ele é um idiota!
   As lágrimas fugiram do controle. Um abraço era a única coisa que podia ser dita para calar a dor.
   Envolveu a decepção da sua amiga em seus braços na esperança de estrangular o sofrimento. Sabia o quanto ela gostava daquele garoto, o quanto já havia sofrido pelo que não era recíproco. O que não conseguia entender era por que ele havia mentido. Tinha certeza que ele sentia o mesmo, ela via em seus olhos.
   Sentia-se mal por ter estimulado que sua amiga assumisse tudo que sentia pelo garoto que provocava esses sentimentos, e logo em seguida ter resultado naquilo. Uma hora de choro ininterrupto.
   Chegou em casa com o ombro pesado de tanto choro que havia enxugado, tanta dor que havia extraído. Estava, também, curiosa, indignada. Ela era uma boa amiga e não ia deixar as coisas pararem ali.
   Marcou um encontro com o dono do coração da sua melhor amiga. Algo descontraído, algo que costumavam fazer.
   Chegou meia hora antes para preparar um diálogo em sua mente.
   - Achei que eu ia chegar cedo... - ele disse aproximando-se e sorrindo.
   Ela riu:
   - Você falhou, caro amigo - debochou.
   Escolheu não introduzir o assunto de primeira. Pediram a comida e, enquanto esperavam, foram levando um papo descontraído. A comida chegou sem muita demora e começaram a se deliciar com seus pedidos. Conversando, mastigando, bebendo.
   - Ei, me explica uma coisa. - disse como quem não quer nada.
   - O que?
   - Por que você mentiu? - sempre havia sido direta, nada sutil, mas eles já se conheciam muito bem. Tinham tal intimidade.
   Quase engasgou antes de responder:
   - Mentir? Como assim? - desentendido.
   - Você sabe do que eu estou falando...
   Engoliu devagar para ganhar tempo para pensar:
   - Eu não gosto dela.
   - Gosta sim! Você sabe que gosta. - proferiu essas palavras com seriedade e calma em sua voz.
   Procurava maneiras de evitar o assunto e contornar a situação.
   - Nossa! Isso aqui está uma delícia.
   - Você é péssimo em mudar de assunto sabia?
   Ela o conhecia bem demais. Seria em vão continuar mentindo.
   - Eu gosto de você.
   Dessa vez ela não conseguiu manter a serenidade da conversa cheia de tensão, e caiu no riso sem fim.
  - O que foi? Do que você está rindo?
  - Essa... - risadas - foi a melhor - mais risadas acompanhadas de olhos cheios d'água - piada que você já contou.
   Respirou fundo. Conteve o riso. Não aguentou. Riu mais um pouco.
   - Ok! - inconformado - Porra! Você me conhece bem demais. - juntou-se a ela nas risadas.
   - Pronto - voltou a ficar séria - agora me explique.
   - Antes - fez uma pausa - como você sabe que estou mentindo?
   - Por favor, né? - olhou para ele impaciente - Conheço você há apenas cinco anos, te vejo todos os dias, até quando não quero. Já vi você com muitas garotas, mas nunca vi você olhar para ninguém como olha para ela.
   Baixou a cabeça para evitar transparecer a confirmação daquelas palavras.
   - Eu não posso - disse baixinho.
   - Não pode o que? Ser feliz com alguém? Fazer uma garota feliz?
   Levantou o olhar para encontrar a certeza dela.
   - Não posso... - a voz falhou, as palavras que dariam continuidade a frase sumiram.
   Ela esperou em silêncio o resto.
   - Sentir. Não isso.
   - Não acredito! Não acredito como você pode ser tão egocêntrico às vezes. Isso tudo se trata desse seu medo bobo de se envolver por mais de uma semana com alguém, não é?
   - Ei! Eu já passei três meses com uma garota.
   - Qual? Aquela que morava lá na puta que pariu e que vocês se viram só duas vezes durante aquilo que ELA chamava de namoro?
    Percebeu que realmente tinha medo. Medo de se envolver, de envolver outro alguém, de se apaixonar, de ser feliz sem estar sozinho.
    - O que eu fiz? - falou sem a intenção de ser ouvido.
   Era atingido por rápidas percepções. Tinha medo, por sempre ter sido insensível. Sentir era impossível, na visão que tinha de si. Estava sentindo. Sentindo muito mais do que achava que era capaz. Era amor. O tão temido amor. O tão avassalador amor. O tão incontrolável amor. Tinha dispensado o amor. Tinha decepcionado quem mais amava, a única que havia amado.
    - O que eu fiz? - repetiu. Dessa vez olhando para sua melhor amiga. Aquele que mostrava para ele tudo que ele precisava, na hora que ele precisava. Esperando que mais uma vez ela desse uma explicação plausível pelas atitudes dele.
     Não respondeu.
     - O que eu fiz? - impaciente - Me responde, porra!
     Ela riu de leve. Era maldade rir da dor dele, mas não conseguia segurar-se ao vê-lo tão indignado por ter dispensado uma garota.
    - Você foi covarde.
    - O que eu faço? - desespero era a única coisa legível em seu olhar.
    - Corre. Corre muito e rápido. Corre para não perder o que é seu.
    Não pensou duas vezes. Levantou-se e saiu correndo. Antes de chegar a saída do restaurante, parou rapidamente e voltou.
    - Levanta! - falou em um tom mandão para sua amiga.
    - Por que?
    - Levanta!
    Ela afastou a cadeira da mesa e ficou de pé. Foi puxada para ele.
    - Obrigado.
    Eles estavam abraçados. Ele estava agradecendo pela amiga que tinha, pelas palavras duras e sinceras.
    Deu um beijo no rosto dela e saiu mais uma vez.
    - E a conta? - ela gritou sorrindo.
    - Prometo que te compenso depois! - gritou ainda mais alto e com pressa. Pressa de amar.

No comments:

Post a Comment